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Em editorial, jornal O Globo pede à Câmara que rejeite a PEC 5

A proposta traz mudanças no Conselho Nacional do Ministério Público, responsável por fiscalizar a conduta de promotores e procuradores

A PEC-5/21, que altera a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), e com previsão de votação para a próxima terça-feira, dia 19, deve ser rejeitada ou esquecida, diz o editorial do jornal O Globo, publicado hoje, dia 15 de outubro. “A aprovação representaria um golpe mortal na autonomia dos procuradores, garantida pela Constituição”, afirma o texto de opinião, que também circula nas redes sociais.

 

 

Veja neste link a íntegra em PDF

Leia abaixo o texto completo

 

 

Congresso precisa rejeitar a PEC do Ministério Público

Objetivo implícito é tolher autonomia dos procuradores e subjugá-los aos parlamentares

O Congresso precisa rejeitar ou esquecer com celeridade a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 5/ 2021, cujo objetivo implícito é enfraquecer o poder de investigação do Ministério Público (MP). A aprovação representaria um golpe mortal na autonomia dos procuradores, garantida pela Constituição. Não há como um país que preza a independência de suas instituições aceitar essa tentativa descabida de intervenção do Parlamento no MP.

Reação evidente ao avanço da Operação Lava-Jato no combate à corrupção, a PEC foi gestada para atender aos interesses dos investigados, entre eles o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e diversos representantes do Centrão. Sem nem passar pelos ritos na comissão especial, como manda a praxe legislativa, foi conduzida com rapidez ao plenário, numa tentativa de pulverizar o que resta de independência num MP já enfraquecido com Augusto Aras no comando da Procuradoria-Geral da República (PGR), sob os auspícios do retrocesso da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF).

O relatório do deputado Paulo Magalhães (PSD-BA) tornou o projeto original do deputado Paulo Teixeira (PT-SP) ainda pior, com a intenção de sacrificar os pontos mais absurdos como forma de garantir a aprovação. No item mais escandaloso, depois alterado, o texto conferia ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) o poder de rever atos de investigação e interferir no trabalho dos procuradores, extinguindo a autonomia funcional garantida pela Constituição. Seria o equivalente a um conselho de imprensa intervir no conteúdo de veículos jornalísticos; ou um conselho policial, nas ações dos delegados da Polícia Federal.

O relatório conferia aos procuradores-gerais dos MPs a atribuição de indicar dois terços dos conselhos superiores, responsáveis justamente por fiscalizar o procurador-geral (hoje os representantes são escolhidos por eleições internas). O texto também extinguia a prescrição dos processos disciplinares, outro ponto de intimidação por facilitar a condenação dos procuradores. Ambos os pontos foram alterados pelo relator, mas o resultado é insatisfatório.

A PEC ainda altera a composição do CNMP, responsável por investigar atos ilícitos atribuídos aos procuradores, de modo a torná-los minoria no organismo. A representação dos parlamentares, em contrapartida, mais que dobraria, dando ao grupo a maior presença no CNMP. Dentre esses representantes seria escolhido o corregedor nacional, a quem cabem as investigações. Trata-se de outra afronta para subjugar os procuradores, que passariam a trabalhar com uma espada no pescoço. O texto ainda dá um prazo de 120 dias para o CNMP criar um código de ética.

É evidente que abusos dos procuradores, como alguns na Lava-Jato, são intoleráveis e devem estar sujeitos a punição. Mas a estrutura existente é suficiente para dar conta disso. Sujeitar o CNMP ao Congresso, tornar o corregedor nacional um pau-mandado dos parlamentares e permitir a ingerência do organismo no trabalho autônomo dos procuradores são absurdos. Lira tentou ontem pela segunda vez levar a PEC a plenário, mas teve de adiar a votação. Nenhum dos escrutínios que examinaram requerimentos reuniu os 308 votos necessários para aprovar a PEC na Câmara. Não se trata mais de “aprofundar as discussões”. Os parlamentares têm o dever de rejeitá-la — e de cuidar dos problemas reais do país.