APMP 80 anos: Constituição do Estado de 1947 vedou exercício da advocacia
Mário Mello Freire, Hugo Nigro Mazzilli e Luiz Antônio Fleury Filho, ex-presidentes da APMP, destacam o momento de ‘importância e relevância’ para o Ministério Público e o ‘tratamento isonômico com a Magistratura’
Na edição 349 do informativo “MP Paulista”, de novembro de 1988, comemorativo aos 50 anos da Associação Paulista do Ministério Público (APMP), Mário Mello Freire (1911-2005), tesoureiro da entidade de classe entre 1952 e 1955 e presidente de 1956 a 1960, afirmou: “A Instituição só tomou consciência de sua importância e relevância (…) a partir do momento em que se proibiu a advocacia aos promotores, em 1947. Nesse momento ela tornou-se mais pujante”. Ele se referia à Constituição do Estado de São Paulo promulgada em 9 de julho de 1947.
O procurador de Justiça aposentado Hugo Nigro Mazzilli, que presidiu a APMP em 1990, ressalta, em seu livro “Regime jurídico do Ministério Público: análise do Ministério Público na Constituição, na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público da União e na Lei Orgânica do Ministério Público paulista” (Editora Saraiva, 2013), que “o modelo paulista de 1947 passou a inspirar, até hoje, um tratamento isonômico entre MP e Magistratura”. A proibição do exercício da advocacia por membros do Ministério Público só seria levada para outros estados muitas décadas depois.
Luiz Antônio Fleury Filho, presidente da APMP de 1982 a 1986, relembra iniciativa de tentar criar uma doutrina única de Ministério Público: “Para se ter ideia, em Pernambuco, na época [início dos anos 1980], o presidente da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] era membro do Ministério Público na ativa, não havia proibição de advogar, coisa que aqui em São Paulo, desde 1947, já era proibido. No Paraná, o procurador-geral [de Justiça] recebeu título de desembargador-chefe do Ministério Público; na maioria dos estados os promotores advogavam, e nós tínhamos o Ministério Público Federal, que era reduzido porque os seus membros, na verdade, exerciam advocacia-geral da União em conjunto”.
No texto “História do MPSP”, disponível no site da instituição, Karina Santos de Oliveira, historiadora do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), detalha: “O Capítulo V da Constituição [do Estado de São Paulo promulgada em 1947] regulava a estrutura e o funcionamento do Ministério Público. O cargo máximo da instituição passou a ser nominado procurador-geral da Justiça. Porém, o mais importante a se salientar em relação à Constituição paulista é a vedação do exercício da advocacia aos membros do Ministério Público, sob pena de perda do cargo, e em contrapartida, a equiparação dos vencimentos dos membros do Ministério Público de primeira instância aos juízes das respectivas entrâncias”.
As mudanças na instituição prosseguiam. “Mais adiante, em 1953, veio a obrigatoriedade de a chefia da Instituição caber a um dos 11 integrantes de seu Colégio de Procuradores, em lista tríplice elaborada por este e apresentada ao governador do Estado, ao qual se permitia demiti-lo quando quisesse”, relembra o procurador de Justiça aposentado Antônio Visconti, ex-conselheiro fiscal [de 1973 a 1976] e um dos atuais assessores especiais da Presidência da APMP [desde 2015], em texto de sua autoria intitulado “A independência do Ministério Público”, constante do livro “Justiça, Cidadania e Democracia” (SciELO Books, 2009), que tem como coordenador o promotor de Justiça Roberto Livianu.
Visconti prossegue, no referido texto: “Teoricamente, o procurador-geral de Justiça poderia não ser do agrado do chefe do Executivo, bastando que um grupo majoritário suficientemente coeso formasse a lista, na qual os três indiferentemente estivessem comprometidos com seu ideário. Nunca se atingiu, contudo, tal grau de coesão, sempre se digladiando ao menos dois grupos, em alguns períodos com grande acirramento, manobrando, quase sempre, o grupo preterido para mudar o chefe do parquet, de forma que o governador do Estado conservava grande influência nos destinos da Instituição”.
O procurador de Justiça aposentado complementa: “As divergências no Colégio de Procuradores se estendiam à quase totalidade da classe, que formava o Conselho Superior do Ministério Público [CSMP]. E a própria elaboração legislativa se dava muito ao sabor da força política de um ou outro grupo (por um curto período, na década de 60, a classe elegia dois dos quatro membros eleitos do Conselho Superior, e o Colégio de Procuradores, os outros dois, voltando-se ao sistema anterior na Constituição Estadual de 1967)”.